I. Nos termos do art. 337º, nº 1, do Código do Trabalho, o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

 II. Se, aquando da revogação do contrato de trabalho, as partes acordarem na atribuição ao trabalhador de uma compensação pecuniária global, como contrapartida do termo da relação laboral, presume-se (iuris tantum) que a mesma inclui os créditos vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude desta.

 III. O trabalhador tem a possibilidade de – ilidindo esta presunção – reclamar os créditos vencidos à data da cessação do contrato, ou exigíveis em virtude desta, que não tenham sido incluídos naquela compensação global, caso em que é aplicável o prazo prescricional de um ano supra supramencionado.

 IV. Ao crédito relativo à compensação pecuniária global acordada aquando da revogação do contrato de trabalho é aplicável o prazo de prescrição ordinária de vinte anos (art. 309º, do C. Civil), e não o prazo de um ano.

 Ac. do STJ, de 15.01.25 in www.dgsi.pt (Proc. n.º 12354/23.6T8PRT.P1.S1)

 

 

Regime especial do tempo de férias aquando da cessação contratual A norma corretiva do art. 245º, nº 3, CT



 O art. 245º, nº 3, CT, dispõe que: Em caso de cessação de contrato no ano civil subsequente ao da admissão ou cuja duração não seja superior a 12 meses, o cômputo total das férias ou da correspondente retribuição a que o trabalhador tenha direito não pode exceder o proporcional ao período anual de férias tendo em conta a duração do contrato.
O ponto de referência firma-se no período anual de férias (22 dias úteis, ou seja, 2 dias por cada mês, tendo por referência 11 meses, pois exclui-se da contagem o mês de férias).Assim, um trabalhador admitido em 1 de maio de 2016, cujo contrato cesse em 31 de julho de 2017, trabalhou 15 meses. Assim: 15x2= 30 dias úteis de férias. A norma corretiva do nº 3, pretende afastar o regime geral do nº 1. Caso se aplicasse o regime geral, o trabalhador teria em 2016, direito entre  12 a 16 dias de férias, atendendo a que prestou, minimum, seis meses efetivos de trabalho,  nos termos do art. 239º,  nº 1, e em 1 de janeiro de 2017, vencer-se-iam 22 dias úteis (art. 245º, nº 1, al. a)), o que perfazeria entre 34 a 38 dias úteis de férias. A tal valor haveria, ainda, a acrescer 7/12 de proporcionais (al. b)). 
Hipótese que a norma não consente.


O gozo das férias no ano de admissão: CT/2003 v. CT/2009

A redação do art. 212º, nº 3, do CT/2003, dispunha que: “No caso de sobrevir o termo do ano civil antes de decorrido o prazo referido no número anterior (seis meses completos de execução do contrato) ou antes de gozado o direito a férias, pode o trabalhador usufruí-lo até 30 de junho do ano civil subsequente”. E a norma de restrição do âmbito temporal, constante do nº 4, indicava: “Da aplicação do disposto nos nºs 2 (caso em que o trabalhador gozava as férias no ano de admissão) e 3 (casos em que o trabalhador não gozava as férias no ano de admissão, por  não completude do prazo de garantia ou por não ter sido libertado para o gozo) não pode resultar  para o trabalhador o direito ao gozo de um período de férias, no mesmo ano civil, superior a 30 dias úteis, sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho”. No regime do CT/2003, o nº 4 cuida da transferência de tempo de trabalho ou de gozo das férias para o ano civil seguinte, impondo para ambos os casos um regime de restrição.O CT/2009, indica no art. 239º, nº 2:“No caso de o ano civil terminar antes de decorrido o prazo referido no número anterior (seis meses completos de execução do contrato), as férias são gozadas até 30 de junho do ano subsequente”. O regime atual não acolheu a segunda vertente: “antes de gozado o direito a férias”.O nº 3, igualmente uma norma de restrição do âmbito temporal, indica: “Da aplicação do disposto nos números anteriores (ou melhor, do número anterior) não pode resultar o gozo, no mesmo ano civil, de mais de 30 dias úteis, sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho”. Assim, se o ano civil terminar antes de decorrido o prazo prestacional de seis meses, as férias são gozadas até 30 de junho do ano civil subsequente, correspondendo esse gozo ao trabalho efetivamente prestado no ano da admissão. Havendo, ainda, a restrição prevista no nº 3 (impossibilidade de gozo de mais do que 30 dias úteis). Se o ano civil terminar depois de decorrido o prazo prestacional de seis meses, as férias são gozadas no ano em que se vencem, ou seja, no ano da admissão, não podendo ser transferido o respetivo gozo para o ano civil seguinte. Pelo que, após os seis meses de prestação efetiva, se vencem, igualmente,  22 dias de férias, não se aplicando a norma de restrição do nº 3. 

Storytelling nº 1:





Dizia-me um colega que lhe perguntavam se trabalhava ou só dava aulas. Naturalmente, que só damos (e de forma mais literal do que o ensejável) aulas. Os professores não trabalham! É uma espécie que nasce com o conhecimento adquirido num chip. Eu, por exemplo, nasci a recitar o art. 140º, do CT, mesmo antes do mesmo ser publicado.

Percurso jurídico do assédio moral




Disponível o artigo sobre o "Percurso jurídico do assédio moral".





O percurso do assédio laboral


Temas de Direito do Trabalho e de Processo do Trabalho

O percurso do assédio laboral


https://educast.fccn.pt/vod/clips/pgzcs888f/flash.html?locale=pt

A integridade física e moral do trabalhador como direito de personalidade


“A tutela dos direitos fundamentais em Portugal recebe, numa primeira fase, apenas o reconhecimento da civilística. Só com o Código Civil de Seabra (1867) se apresenta expressamente uma tutela civil dos direitos fundamentais, apontando para o reconhecimento de um direito geral de personalidade, apoiado na sistemática antropocêntrica ou «indivíduo-cêntrica».
Esse entendimento não foi acolhido pelo positivismo que marcou a composição do Código Civil de 1966, fortemente influenciado pelo Código Civil Francês, o qual admitiu somente diversos direitos especiais de personalidade
Muito depois, se assiste à sua constitucionalização. E relevamos somente a Constituição da República Portuguesa de 1976.
As Constituições anteriores não detêm uma tutela significa ou desconsideram a questão social.
A conveniência da constitucionalização dos direitos fundamentais está ligada ao esvaziamento ou à redução pretendida pelo legislador ordinário. A constitucionalização dedireitos, liberdades e garantias visa dotá-los de uma tutela reforçada a determinados bens jurídicos. A Constituição Portuguesa de 1976 apresenta um catálogo extenso de direitos fundamentais, divididos em “direitos, liberdades e garantias”. A elevação da dignidade constitucional a princípios protetivos dos trabalhadores criou a denominação de Constituição Laboral (arts. 53º a 57º), assumida como um conjunto de normas e de «princípios gerais ou fundamentais». Por sua vez, os direitos sociais são considerados como direitos a prestações (art. 58º, da CRP)” [1].
Prestam-se a uma certa ambiguidade terminológica os conceitos de direitos do homemdireitos fundamentais direitos de personalidade, pese embora, não sejam necessariamente coniventes e convergentes
Os direitos do homem ganharam fôlego no direito internacional e os direitos fundamentais no direito constitucional.
Quanto aos direitos de personalidade, explica Jorge Miranda [2]: “Os direitos fundamentais pressupõem relações de poder, os direitos de personalidade relações de igualdade. Os direitos fundamentais têm uma incidênciapublicits imediata, ainda quando ocorram efeitos nas relações entre os particulares (…); os direitos de personalidade uma incidência privatística, ainda quando sobreposta ou subposta à dos direitos fundamentais. Os direitos fundamentais pertencem ao domínio do Direito Constitucional, os direitos de personalidade ao Direito Civil”.
Paulo Ferreira da Cunha [3] critica a dicotomia de Jorge Miranda, e citando Larenz explica que: “O direito privado é um segmento da ordem jurídica global e, assim como esta, não cura de indivíduos que vivem isoladamente, antes de pessoas que com outras vivem numa comunidade social.
Encontra-se ainda subordinado a exigências da justiça social. É certo que ao Direito privado cabe antes de mais a realização da personalidade particular nas relações com os outros. (…). Em suma: continuamos a pensar que os direitos de personalidade são a manifestação privatística de direitos fundamentais, e que estes não são apenas a sua versão publicista (…). O facto de vincularem entidades públicas e privadas (art. 18º, nº 1, da CRP) parece-nos esclarecer que se não limitam ao direito público, ou a relações em que um dos sujeitos seja público. Também valem nas relações totalmente inter pares,inter cives … Além disso, há direitos fundamentais de pessoas coletivas e organizações. (…). Assim, por ex., se considerarmos um direito geral de personalidade, como faz Orlando de Carvalho, enquanto «direito à pessoa ser e à pessoa devir», e se o compararmos com o direito ao livre desenvolvimento da personalidade (art. 26º, nº 1, da CRP), vemos como a coincidência ou fungibilidade objetiva está crescentemente ocorrendo”. [4]
A nível internacional, domina a terminologiadireitos do homem [5], sendo o conceito direitos fundamentais domínio das leis nacionais. A romper com a tradição, surge a “Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia”.
A expressão direitos fundamentais parece ter surgido em França, por volta de 1770. Todavia, veio a adquirir projeção na Alemanha, onde os Grundrecht passaram a dominar o sistema de relações entre o indivíduo e o Estado. Jellinek descreve o status como “uma relação com o Estado que qualifica o indivíduo”. [6]
Para José de Melo Alexandrino os direitos de personalidade são as “situações jurídicas básicas do homem reconhecidas pela lei civil”[7].
Quanto à existência de direitos de personalidade na CRP, assim configurados, a resposta é perentoriamente negativa. Os direitos previstos expressamente na Constituição denominam-se direitos fundamentais e não direitos de personalidade, atendendo à respetiva razão histórica da sua consagração: a de proteger, essencialmente, os particulares contra o Estado. Por outro lado, o de obrigar o próprio Estado a proteger os particulares de outros particulares. No entanto, os direitos ditos de personalidade consagrados no Código do Trabalho, possuem integral acolhimento superior, assentando na ideia constitucional da liberdade.
“Por tradição histórica, a distinção entre direitos e liberdades realiza-se atendendo à posição jurídica do cidadão perante o Estado, numa relação de verticalidade legitimidade pela heterotutela conferida ao poder público. Estes direitos de primeira geração, na sua interpretação clássica, estão associados a umstatus negativus, que impõe ao Estado um dever de abstenção perante as manifestações da pessoa, as liberdades visam defender, na sua essência, o cidadão perante a intervenção do Estado” [8].
Os direitos, quer “os tradicionais «direitos naturais», inerentes ao homem (direito à vida, à integridade das pessoas), quer os direitos ligados ao status activus do indivíduo” (sob a designação de direitos políticos, liberdades-participação, direitos do cidadão), permitem ao respetivo sujeito um campo de intervenção positiva ou negativa perante a comunidade em geral.
Por garantias, entende-se “quer o direito dos cidadãos a exigir dos poderes públicos a proteção dos seus direitos, quer o reconhecimento dos meios processuais adequados a essa finalidade” [9].
Ou seja, as garantias apresentam um nível de proteção maior do que os próprios direitos.
Mais do que nunca, na adversidade laboral, osdireitos de personalidade não podem ser postergados. O espaço do direito do trabalho nasce da aceitação jurídica das desigualdades das partes, da relação não paritária, e assim se deverá manter. O trabalhador não é titular da empresa, não quinhoa na sua dinâmica financeira (nos lucros e nas perdas); não obstante, ele é também a empresa, a sua voz, as suas mãos. A coisificação do trabalhador que o relaciona como um recurso (o recurso humano, entre outros, porventura mais valiosos, como a maquinaria e o capital) e que lamentavelmente hoje ainda perdura, não pode levar à sua desumanização.

[1] Paula Quintas, Os Direitos de Personalidade Consagrados no Código do Trabalho na Perspetiva Exclusiva do Trabalhador Subordinado – Direitos (Des)Figurados,Coimbra: Almedina, 2013, pp. 100-101.
[2] Manual de Direito Constitucional, T. IV, Coimbra: Coimbra Editora, 2008, 4ª ed., pp. 58-59.
[3] Desafio metodológico dos direitos de personalidade: categorias e conceitos nos 20 anos do CSC – Homenagem aos Profs. Doutores A. Ferrer Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier. BFDUC. Vol. III, Varia Coimbra:  Coimbra Editora.  2007, p. 839.
[4] P. 842.
[5] Declaração Universal dos Direitos do Homem, Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
[6] Citado por Robert Alexy, Teoria dos Direitos Fundamentais, tradução de Virgílio Afonso da Silva da 5ª ed. alemã (Theorie der Grundrechte, publicada pela Suhrkamp Verlag, em 2006), Malheiros Editores, teoria & direito público. 2008, p. 257.
[7] Direitos Fundamentais – Introdução Geral. Cascais: Principia. 2007, p. 32.
[8] Paula Quintas, Os Direitos de Personalidade, já citado, p. 112.
[9] Robert Alexy, op. cit., p. 311